segunda-feira, 7 de março de 2016

Delcídio é o PT no poder‏ - por Lúcio Flávio Pinto

Todas as acusações que o senador Delcídio do Amaral fez no seu acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal são falsas. Ele inventou as histórias para se vingar do PT e do seu governo, que não o livrou dos três meses de prisão que passou em Brasília, flagrado na tentativa de eliminar provas de corrupção na Petrobrás e subornar uma das suas principais testemunhas.
Com esses argumentos, o PT procurou desacreditar, ontem, as declarações que Delcídio fez ao MPF, durante três dias de depoimentos, que ocuparam 400 páginas. O teor do documento foi divulgado pela revista Istoé em edição especial, no maior “furo” da imprensa desde o início da cobertura da Operação Lava-Jato, há dois anos.
Se a descida do senador ao inferno não tivesse começado em dezembro do ano passado, quando ele foi preso pela Polícia Federal, mesmo estando no pleno exercício de um cargo eletivo, no próximo mês Delcídio iria completar dois anos como líder do governo. Não apenas no Senado: também no Congresso Nacional, que reúne a câmara alta e a Câmara dos Deputados.
O senador só foi colocado nessa importante função por decisão pessoal da presidente Dilma Rousseff, que é a chefe do governo. Chefe com mão forte, olhos fechados e ouvidos imunes a influências outras que não as desejadas por ela mesma. Como pode ter errado tão completamente na delegação de poder a quem agora chama de mentiroso e mau caráter?
A relação de Delcídio com o PT começou em 2001, quando ele foi secretário de infraestrutura do governo de Zeca do PT, em Mato Grosso do Sul (mais petista, impossível). O polêmico governador mobilizou a máquina pública estadual para fazer do seu auxiliar, muito pesado eleitoralmente, senador. Sem essa base, o engenheiro jamais teria conseguido a vitória, que não lhe veio quando tentou ser também governador em duas eleições seguidas.
O que ele conseguiu foi se tornar um importante e muito útil negociador de bastidores para o PT, que, agora, além de acusá-lo de traidor, o considera um tucano enrustido no ninho do Partido dos Trabalhadores. A tucanagem de Delcídio, porém, nada teve de política: significou a sua passagem de uma bem sucedida carreira técnica para a do tráfico de influência e a montagem de um esquema de corrupção que o tornaria rico rapidamente.
Entre 2000 e 2001, no literal epílogo do governo de Fernando Henrique Cardoso, ele foi diretor de gás e energia da Petrobrás. Com dois dos seus gerentes, Nestor Cerveró (promovido a diretor da área internacional por Dilma) e Paulo Roberto Costa (colocado por Lula na diretoria de abastecimento, por indicação do deputado federal José Janene, personagem destacado do mensalão), concebeu a trama para superfaturar contratos e desviar recursos da estatal, através de caixa 2 (e de um cartel das maiores empreiteiras do Brasil) para os intermediários do pagamento de propina aos políticos que lhes davam suporte. Esse mecanismo entrou em ação na passagem da gestão de FHC à de Lula.
Com sua inteligência, capacidade técnica, traquejo político, simpatia e as características de bon-vivant, Delcídio agia como uma lançadeira de tear, costurando acordos, fazendo ligações de interesses, indo e vindo de escaninhos nos bastidores do poder. Tornou-se líder exatamente por desempenhar tarefas e cumprir ordens. O que o desgraçou foi a megalomania e, como sempre, a certeza da impunidade. Em três meses de cadeia perdeu 12 quilos. Era o sinal de que estava sofrendo e cada vez mais decepcionado. Não era para isso que fez o que fez.
Estão comparando-o a Pedro Collor, que ofereceu na bandeja da imprensa a cabeça do irmão, o então presidente Fernando Collor de Mello (em papel mais destacado agora, no petrolão). Mas Delcídio é mais do que Pedro, muito mais. Ele era o militante das alcovas, porões e sótãos do poder. Um homem do PT que se apaixonou pelo poder, se julgou inalcançável pelos pobres mortais e desandou a cometer falcatruas, tanto ou mais do que os partidos viciados para os quais iria servir de alternativa sadia.
Ao invés disso, o PT caiou de corporativismo socialista (na verdade, burocrático) o aparato estatal, como “nunca antes” (se Lula pudesse aplicar o seu inefável bordão a esse caso), e está conduzindo o Brasil à maior crise econômica da sua história. Desta vez, tendo como componente principal não uma causa externa, por alguma das crises que estourou na matriz e ecoam na filial, mas por incompetência e má fé.
Ao metralhar verbalmente (ao menos por enquanto) quem era o líder do seu governo no parlamento federal até três meses atrás, o PT quer mostrar que não é o PT de Delcídio do Amaral. Mas Delcídio é o PT que se aboletou no poder e dele tem que sair – ou cair, por se ter tornado uma fruta podre no galho mais alto do país.
Não era disso que o Brasil precisava neste momento. Mas é o prato feito (e péssimo) que, mais uma vez, sua elite lhe oferece.
Quosque tandem abutere, Lula, patientia nostra?
Fonte: https://lucioflaviopinto.wordpress.com/2016/03/04/delcidio-e-o-pt-no-poder/

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